A floresta amazônica, um extraordinário equilíbrio sonoro nas 3 dimensões do espaço físico.
Fiquei maravilhada ao descobrir os sons da floresta amazônica durante minha viagem à Guiana francesa para três recitais em dezembro de 2006. O mistério pelo qual conseguimos distinguir cada som em meio a dezenas ou centenas de outros sons, era para mim como uma paz mundial cujos princípios precisavam urgentemente ser entendidos.
Após uma longa imersão no universo amazônico e inúmeras observações sobre a sincronização dos sons dos seres vivos nas 3 dimensões do espaço, concebi gradualmente a harmonia rítmico-espacial, que é a arquitectura de minhas composições musicais e criações desde 2010. Também emiti algumas hipótesis sobre esta organização espaço-temporal sonora, que começam a receber confirmações científicas internacionais desde 2017.
A harmonia rítmico-espacial é uma linguagem musical que liga o tempo e o espaço, baseada nas regras da proxemia física e temporal natural que observei na floresta. Distâncias precisas são estabelecidas entre as fontes sonoras, posicionadas ao redor do público. O equilíbrio sonoro entre as fontes é realizado por meio desta organização espaço-temporal: trata-se de um conceito musical biomimético, inspirado no equilíbrio multipolar natural da biodiversidade.
Permite criar “melodias espacializadas” que evoluem entre vários pontos do espaço de uma sala, desenvolver dialogos ou multilogos musicais entre estes pontos, e movimentos sonoros no espaço físico em 3 dimensões. É visual para as criações de dança, filmes ou instalações sonoras. Na ópera, a harmonia rítmico-espacial participa diretamente da ação teatral, trazendo uma expressão espacial do mundo real e do mundo virtual, ou do movimento das emoções¹.
A harmonia rítmico-espacial acrescenta os movimentos do som no espaço ao sistema harmônico clássico ou romântico, ao jazz, às músicas modais, étnicas, populares, ou à qualquer música, tipo de som ou de linguagem. Permite a coexistência «harmoniosa » e perceptível de sistemas musicais muito diferentes, usando as posiçôes no espaço para solucionar o problema dos fatores de coesão nas polirritmias, descrito por Olivier Messiaen². E, tal como por exemplo nas composições de Johann Sebastian Bach, o discurso musical, aqui polirítmico e espacial, é mais importante do que os timbres.
Constrói ritmos percussivos em 3D, populares e eruditos. Usa os camarotes dos teatros à l´ italienne para dispôr pequenos grupos orquestrais ou corais, unindo assim tradição e modernidade. Pode também florescer em salas modernas permitindo vários palcos, em salas de som multicanal e cinemas Dolby.
A harmonia rítmico-espacial é assim uma expressão de nossas multi-vidas multilíngues, virtual-real simultâneos, internet/smartfone/computador/tv/rádio/jogos virtuais/vida real. É a linguagem artística de um novo equilíbrio, espacial, multi dimensional, para as artes, o pensamento e as tecnologias do século XXI. O Filósofo Edgar Morin, pai do Pensamento Complexo multidisciplinar, é seu padrinho.
¹ Compositora francesa cria sinfonias, óperas e balés com sons da Floresta Amazônica
Radio France Internationale, 28-07-2022
Isabelle Sabrié, l’artiste qui compose aux sons de la forêt amazonienne.
Radio France (France Musique), 16-06-2022 ()
² Traité de Rythme, de Couleur et d ´ Ornythologie. Olivier Messiaen. Tome I, p 30.